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Arquitetos: Carlos Castanheira
- Ano: 2013
Descrição enviada pela equipe de projeto. Convidam-me para almoçar na Quinta da Faísca, Alto Douro Vinhateiro, Favaios.
Isto de iniciar arquitetura pelo almoço é interessante e pleno de sabores, odores e conversas. A arquitetura, ou o ato de a pensar, é solitário mas necessita de convivências, de informação e de conhecimentos específicos quer das funções, quer dos futuros utilizadores dos equipamentos a projetar. E precisa do Tempo.
Matéria palpável, absorvente, transformadora e por isso criadora. Esta encomenda vem na sequência de outra para uma adega projectada e construída no Louro, Minho. Os clientes são os memos, o objectivo é produzir vinho, mas tudo é tão diferente. São outras as especificidades e outros os modos. Mas o objectivo é o mesmo: a criação de óptimos vinhos, néctar de homens que desejam ser deuses.
Tal como na Quinta da Casa da Torre, na Quinta da Faísca já havia história, hábitos e bom vinho. Mas é necessário ampliar e melhorar instalações para que o néctar seja apetecível e apreciado. E há o turismo que o Vinho cria e a Douro recebe.
A Adega existente, recentemente renovada e adaptada às novas tecnologias e exigências, mostrou-se exígua para o desenvolvimento da atividade comercial e, sobretudo, para receber os curiosos e aficionados turistas da Região. A ampliação da Adega é mais do que a ampliação de um espaço onde se cria ou armazena e matura o vinho. No início tive o apetite de contrastar o existente com uma nova forma e com novos materiais. Atitude que rapidamente me pareceu demasiado fácil e de fuga à confrontação com o existente e a História.
É certo que a ruptura da forma e da materialidade é habitual na arquitetura atual, mas ponderei que este não devia ser o caminho. Moveram-se oliveiras e muros de xisto, aproveitou-se o desnível desde a entrada até à cota do acesso superior da adega. Percursos e acessos foram revistos.
A novo volume da Adega da Quinta da Faísca é composto por três outros: O volume revestido a esteios de xisto negro e cobertura plana onde se concentraram todas as instalações de pessoal, sanitários, arrumos e cozinha.
O volume coberto pelo grande telhado, muito idêntico ao existente, onde, no piso superior, existe um grande salão para recepção de convidados. Dois terraços, a norte para receber, a sul para usufruir da paisagem e da sucessão de montes e vales que nos levam até ao Douro que os moldou e continua a moldar.
Sob este salão, dois espaços em cave permitirão o tratamento e repouso dos vinhos. À cota inferior, diretamente ligada com a adega existente, será criado um espaço de distribuição e armazenamento temporário.
O terceiro volume é somente um coberto que protege a passagem exterior entre a adega existente e o novo espaço. É um volume aberto na sua ligeireza construtiva e funcional. Pretende-se que a adega funcione e que produza excelentes vinhos, que os visitantes percorram os espaços e compreendam as funções, e deixem que os sentidos se exaltem, do sabor ao tacto, da visão ao cheiro.
A madeira das estruturas, o xisto das paredes e pavimentos, ou o granito dos cunhais não são mimetismos ou pastiches, mas antes a continuidade interpretativa do melhor que se tem e que se sabe fazer na nossa construção, sobretudo no Douro.
Dizem que o amor passa pelo estômago. A arquitetura passa, certamente, pela cabeça. Quando ajudada por um almoço com bons vinhos ... melhor.